quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Grupo britânico defende liberdade de juízes em casos de homicídio


O relatório do Grupo de Assessoria de Revisão de Homicídios recomendando a abolição das sentenças de prisão perpétua obrigatórias ecoa as conclusões de um relatório semelhante encomendado há quase 20 anos pela Fundação de Reforma Penitenciária. Nos dois casos, comitês de destacados acadêmicos, profissionais e juízes ressaltaram a iniquidade de um sistema que requer a imposição de uma pena obrigatória de prisão perpétua em casos de condenações por homicídio, sejam quais forem as circunstâncias do crime.

Também se chamou a atenção para a falta de compreensão do público em relação ao sistema de sentenciamento e libertação em tais casos.

Contudo, a despeito dessas preocupações, a tendência crescente vem sendo de estender o uso de sentenças vitalícias obrigatórias, mesmo em crimes menos graves que o homicídio doloso. O governo trabalhista anterior fez experimentos com sentenças automáticas de prisão vitalícia por segundos crimes graves cometidos entre 1997-2005, e Ken Clarke (o secretário de Justiça britânico) tem planos de reativar uma sentença obrigatória semelhante em seu mais recente projeto de lei de sentenciamento.

O problema específico desta sentença após uma condenação por homicídio, como apontou Simon Jenkins, é que ela não reconhece a grande diversidade de circunstâncias em que um homicídio pode ser cometido. Como observa o relatório, uma condenação por homicídio após um "assassinato por misericórdia" resultará na imposição da mesma sentença que é dada por um homicídio premeditado, cometido com vistas a obter ganho financeiro.

O caso de Frances Inglis ilustra explicitamente as consequências desta lei superada. Frances foi condenado por matar seu próprio filho com uma injeção de heroína, depois de ele ter sofrido lesões cerebrais graves por ter caído de uma ambulância. Ela é apoiada por sua família, incluindo seus outros filhos e o pai deles. Quando ela apresentou sua apelação contra a sentença, o juiz principal aceitou plenamente que tratava-se de um "assassinato por misericórdia" genuíno, motivado pelo desejo de Frances de pôr fim ao sofrimento de seu filho. Ele comentou que o crime foi "muito diferente de um homicídio comum".

Mas disse que não podia impedir a imposição da sentença de prisão perpétua, conforme prevista pela lei.

O conceito de assassinato por misericórdia ser incluído na definição mais ampla de homicídio vem fazendo parte das discussões sobre a sentença vitalícia obrigatória, há muitos anos. Em 1976 o comitê de revisão do código criminal sugeriu que os assassinatos por misericórdia fossem classificados como delito específico, punível com pena máxima de dois anos de prisão. Em 1989, um comitê seleto da Câmara dos Lordes também defendeu que os assassinatos por misericórdia fossem vistos como um delito específico.

O relatório mais recente sobre o assunto, apresentado pela comissão legal em 2006, foi menos claro, sugerindo que seria necessária uma discussão mais ampla para determinar se a motivação da compaixão pode em alguma circunstância ser usada para justificar um homicídio.

Enquanto o debate mais amplo é conduzido, a solução óbvia para esse problema é dar direito aos juízes de decidir no processo de sentenciamento, eliminando o regime de sentenças obrigatórias. Embora o princípio filosófico por trás das sentenças obrigatórias possa ter sua origem num enfoque igualitário - punir o crime, não a pessoa -, o imperativo político é invariavelmente uma resposta dada à acusação de "leniência com o crime". O resultado sempre é o aumento das sentenças, resultado esse inevitável quando os critérios obrigatórios precisam abranger uma gama tão larga de circunstâncias.

O papel do Judiciário no processo de justiça criminal deve ser o de fornecer o equilíbrio apropriado entre dois interesses que sempre vão criar conflito: a necessidade de proteger os cidadãos contra a criminalidade e a possível infração de liberdades civis cometida por governos em seus esforços para punir a criminalidade. A eliminação do direito de decisão dos juízes enfraquece o conceito de um Judiciário verdadeiramente independente do governo e enfraquece a capacidade dele de alcançar esse ponto de equilíbrio.

Frances Inglis continua presa. Sua libertação futura vai depender de ela conseguir passar pelas engrenagens kafkianas, primeiro do sistema carcerário e depois da Comissão de Condicional. Quando, eventualmente, ela for libertada, continuará em condicional pelo resto de sua vida, podendo ser chamada de volta à prisão a qualquer momento, mesmo que não cometa nenhum outro crime.

Chama a atenção que essas restrições serão impostas a uma pessoa sobre a qual o juiz principal do julgamento teve a dizer o seguinte: "Não há dúvidas quanto à sinceridade de sua crença de que suas ações de preparar-se para matar seu filho e matá-lo representaram um ato de misericórdia e que a tristeza decorrente da perda de seu filho não é menor pelo fato de ela ter sido responsável por sua morte".

THE GUARDIAN/FOLHA