Nikos Smyrnaios
Efemeron (Grécia)
Eleições regionais realizadas na França confirmaram que prossegue por
lá o avanço da Frente Nacional, que começou em 2011, quando Marine Le
Pen assumiu a liderança do partido. A presença dos fascistas no 2º turno
da eleição presidencial de 2017 é agora altamente provável, o que pode
levá-los à presidência do país.
O establishment político francês, ou seja, a direita, trouxe de volta
Sarkozy. O resultado de um confronto hipotético Le Pen-Hollande-Sarkozy
em 2017 é bastante incerto. A possibilidade de vitória da extrema
direita no segundo maior país da União Europeia já não é irrealista.
Há duas razões principais que explicam esse pesadelo, mas é cenário
provável. Por um lado, a estratégia eleitoral reconhecidamente
bem-sucedida do partido de Le Pen. Por outro, o abandono, pelos
socialistas, dos estratos pobres da sociedade; e a fragmentação da
esquerda radical. Aconteceu na atmosfera insalubre circundante, na qual a
islamofobia cresceu, insuflada por alguns dos veículos da
mídia-empresa, o que piorou após o ataque terrorista contra Charlie
Hebdo.
MARINE LE PEN
Desde 2011, quando tomou as rédeas do partido fundado por seu pai,
Marine Le Pen fez a Frente Nacional ganhar ares de partido ‘decente’, na
consciência de grande parte da opinião pública – embora sem jamais ter
exercido o poder nem jamais se ter manifestado como partido
antissistema. Na verdade, a retórica de Marine Le Pen tem-se centrado na
crítica ao governo de Sarkozy e do governo da União Europeia (partidos
socialistas e UMP). E trabalha em dois eixos: explora a imagem de
“trabalhadora francesa” e uma tal “insegurança cultural”, de que fala
sempre.
A retórica social da Le Pen contém muitas bandeiras que são bandeiras
tradicionais da esquerda, mas foram deixadas para trás: defesa dos
trabalhadores, crítica aos bancos e ao capital, denúncia da hipocrisia
social-democrata, a favor de a França sair da Eurozona, etc.). E com
essa retórica, a Frente Nacional surgiu como o maior partido entre os
eleitores da classe trabalhadora. Mesmo que essa retórica seja
absolutamente hipócrita, pois o partido é partido do capital francês, é
retórica particularmente eficaz com vistas a eleições.
DISCURSO REFINADO
Simultaneamente, Le Pen refinou o seu discurso racista. Já não inclui
bandeiras antissemitas brutais de 2ª Guerra Mundial, como faz seu pai.
Agora, a filha fala de ‘incompatibilidade’ entre ‘valores culturais
europeus’ e o Islã. Para Le Pen, mesmo que jamais o diga tão claramente,
a grande ‘ameaça’ que a Europa enfrenta é a conquista pacífica do
Ocidente, por ondas de imigração em massa.
Certamente a maioria dos membros e simpatizantes da Frente Nacional,
xenófobos e intolerantes, ainda estão em conflito com a maioria dos
eleitores. É o que se comprova pela baixa recepção e pouca simpatia que
os delírios racistas dos candidatos às eleições locais receberam nas
redes sociais.
ESQUERDA FRAGMENTADA
Enquanto isso, a esquerda aparece fragmentada e fraca. A dinâmica do
candidato Mélenchon nas presidenciais de 2012 parece que evaporou. Há
pelo menos três razões para isso.
(1) A competição eleitoral entre partidos de
esquerda, que não favorece uma estratégia eleitoral comum, embora, nos
discursos, todos concordem, teoricamente, sobre a importância de uma
esquerda unida.
(2) Disputas políticas sérias que estão em curso em
campos importantes: em torno da questão do Islã na França; da relação
com a Rússia de Putin e sua posição sobre a guerra na Ucrânia; a
ecologia radical, que contrasta com a abordagem tradicional de
desenvolvimento, etc. O mais recente exemplo desse desentendimento
político dentro da esquerda em toda a Europa é o modelo do partido
Syriza e estimativas sobre a eleição.
(3) A impotência do movimento sindical e social, que
não traduz a insatisfação dos cidadãos organizados no confronto com o
governo. Isso explica, dentre outras coisas, o fracasso da liderança
sindical e a política de repressão rigorosa e muitas vezes violenta de
manifestações e protestos, que recentemente resultou na morte do
manifestante Rémi Fraisse, por granadas de efeito moral.
SARKOZY E VALLS
A gradual retomada do Estado francês por Sarkozy (ministro do
Interior e presidente entre 2002 e 2012) e depois por Manuel Valls
(ministro do Interior dos socialistas e agora primeiro-ministro)
prossegue, sem qualquer abalo, desde depois do ataque a Charlie Hebdo:
mobilização massiva de soldados para proteger a ordem, medidas
extraordinárias de segurança, prisões arbitrárias… Os socialistas estão
pavimentando o caminho para Marine Le Pen (ou Sarkozy). Provavelmente já
é tarde demais para mudar qualquer coisa.
(artigo enviado por Sergio Caldieri, tradução de Vila Vudu)
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