Bernardo Mello Franco
Folha
Na comédia “Em Busca do Cálice Sagrado”, de 1975, o grupo britânico
Monty Python faz piada com o fundamentalismo cristão na Idade Média. Em
uma cena famosa, a população de um vilarejo veste uma mulher com trajes
de bruxa, prende em seu rosto um nariz de bruxa e exige que ela seja
queimada na fogueira. Afinal, trata-se de uma bruxa, grita a multidão
enfurecida.
O noticiário da última semana lembra o filme, mas não tem graça
nenhuma. No Brasil de 2015, a intolerância religiosa está mostrando sua
face em ataques a terreiros, cemitérios e até a crianças.
Em poucos dias, fanáticos apedrejaram uma menina de 11 anos que
voltava de um culto de candomblé, danificaram o túmulo do médium Chico
Xavier e atacaram um templo carioca de umbanda, destruindo a imagem de
uma santa.
Os episódios ocorreram na mesma semana em que a Câmara começou a
discutir um projeto que transforma o “ultraje a culto” em crime
hediondo. No texto, o deputado evangélico Rogério Rosso ataca a Parada
Gay e afirma que o país vive uma onda de “cristofobia”.
Os fatos sugerem que há sim uma ofensiva de intolerância, mas os
principais alvos são outros: homossexuais e praticantes de cultos de
matriz africana. O clima de ódio é alimentado por pregadores radicais,
que tratam a orientação sexual alheia como afronta, bradam contra
“demônios” e chamam religiões afro de “feitiçaria” e “macumba”.
Alguns líderes evangélicos já deram o bom exemplo ao repudiar os atos
de violência, mas também é preciso barrar iniciativas que visam mudar
as leis com base em interpretações literais da Bíblia.
Em outra comédia do Monty Python, “A Vida de Brian” (1979), o
protagonista é confundido com Jesus e termina cantando do alto de uma
cruz. A depender de parte dos nossos legisladores, o filme seria
proibido no Brasil, e os humoristas estariam na cadeia.
Tribuna da Internet