Pedro do Coutto
O título acima, creio, enfoca bem o impacto político produzido pelas
fortíssimas críticas feitas pelo ex-presidente Lula à presidente Dilma
Rousseff durante encontro com religiosos, quinta-feira passada, na sede
do Instituto que leva o seu nome.
As críticas estão registradas
literalmente na extraordinária reportagem de Tatiana Farah e Juliana
Granjeia, na edição de hoje, sábado de O Globo.
A matéria é tão
importante que o jornal a divulgou com exclusividade.
Isso significa
dizer que não a colocou em seu site nas primeiras horas da madrugada,
quando ocorre o fechamento das edições e eles começam a circular.
Me lembrei do título de Hélio Silva: “A História não espera o
amanhecer”. Sim. Porque a reportagem de Tatiana Farah e Juliana Granjeia
possivelmente vai representar um episódio muito intenso do quadro
político brasileiro.
Luiz Inácio Lula da Silva disse aos religiosos, no encontro de São
Paulo, que iria abrir seu coração e acrescentou que cabe a Dilma
Rousseff a responsabilidade pela crise vivida pelos petistas,
enfatizando: “Dilma e eu estamos no volume morto. o PT está abaixo do
volume morto”.
A comparação foi inspirada na crise hídrica que atinge principalmente
o estado de São Paulo, refletindo-se no nível das represas que
abastecem a cidade e a região metropolitana.
Por aí se percebe a
dimensão da contrariedade que gerou a revolta do antecessor e grande
eleitor da atual presidente.
LULA ABALA DILMA
As afirmações de Lula abalam Dilma Rousseff, projetando-a numa faixa
de alto risco político, além de pressioná-la para que ela realize
mudanças substanciais na sua equipe de governo e também na política
econômica que colocou em prática traçada, como se sabe, pelo Joaquim
Levy.
Lula enfatizou inclusive a ocorrência de um fracasso, dizendo “aquele
gabinete presidencial é uma desgraça. Não entra ninguém para dar uma
notícia boa. Essa coisa se perdeu”.
O ex-presidente assinalou que tem
conversado com Dilma e tem dito para que ela vá em frente, ponha o pé na
estrada, e não tema as vaias.
“Os ministros têm de falar; mas não
falam. Parece um governo de mudos”.
Lula disse também que tem chamado
atenção do ministro Aloizio Mercadante dizendo que ele deveria fazer
mais discursos públicos.
Criticou o empenho de Dilma na aprovação do
ajuste fiscal.
Depois do ajuste, vem o quê? Perguntou a Dilma:
“Companheira você se lembra qual foi a última notícia boa que demos ao
Brasil? Ela não se lembrava”.
FATOS NEGATIVOS
O ex-presidente apontou uma série da fatos negativos no governo.
Primeiro, a inflação; segundo, aumento na conta da água; terceiro,
aumento na conta de luz, que para alguns consumidores triplicou; quarto,
aumento da gasolina, do diesel e do dólar.
Neste ponto subiu o tom.
O
FIES que era um sistema tranquilo virou uma desgraceira sem precedentes.
E o anúncio de que ia mexer nas pensões e nas aposentadorias dos
trabalhadores?
Lula destacou também as promessas da candidata na recente
campanha eleitoral e que não foram cumpridas no governo.
Transcreveu,
inclusive as palavras da presidente de que não mexeria no direito dos
trabalhadores nem que a vaca tossisse.
Entretanto – ressaltou – mexeu.
Afirmou também que não ia fazer ajuste porque isso é coisa de “tucano”.
Apesar disso fez o ajuste.
Por este motivo é que os próprios tucanos
estão colocando na TV afirmações de que ela mentiu.
Os destaques alinhados por Luiz Inácio Lula da Silva, evidentemente,
possuem direção certa.
Uma espécie de ultimato visando a que o Palácio
do Planalto altere os rumos da política econômica, em particular, e do
governo de modo geral.
Com isso, ao deslocar a presidente da República
para uma escala de risco, ele no fundo está propondo, é claro, uma
reforma substancial na atuação do Executivo.
Pois não teria cabimento
assumir uma postura de oposição frontal, uma vez que isso prejudicaria
sensivelmente seu projeto de retornar ao poder através das urnas de
2018.
NOVO ESFORÇO
Assim ao colocar de forma tão forte suas discordâncias Lula está
propondo um novo esforço do Planalto para um plano de concordância e
convergência.
Por isso o conteúdo de sua manifestação baseia-se num
objetivo de mudança, sem a qual, sob seu ponto de vista, uma atuação
positiva do governo atual a ele parece, tacitamente ser impossível.
As mudanças que ele destacou de forma genérica dividir-se-ão, é
claro, em pontos a serem concretizados na prática.
Entre eles, a
alteração ministerial e a mudança do rumo econômico e social.
Portanto, a
equipe chefiada por Joaquim Levy sofreu seu grande abalo político desde
que assumiu o comando da economia brasileira.
A equipe econômica, dessa
forma, transformou-se em alvo, não só da oposição, não apenas das ruas,
mas a partir de agora também do principal pilar de sustentação de Dilma
Rousseff junto a opinião pública, o que significa junto à sociedade.
A presença política de Lula é extremamente importante para que o
governo possa respirar.
Caso contrário poderá submergir num mar das
próprias contradições configuradas nos discursos da candidata e nas
ações da presidente.
Tribuna da Internet