Raquel Landim
Folha
Contrariando o discurso morno de dirigentes de multinacionais, o
alemão Phillipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz no Brasil, não
mede palavras para falar de sua desilusão com o país e com o governo
Dilma.
“O país perdeu a previsibilidade com as mudanças nas premissas da
política econômica. Voltamos uns 20 anos no tempo”, disse Schiemer à
Folha. “O PSDB vota contra suas crenças e o PT também. Você acha que
alguém vai se arriscar a investir?”.
O pessimismo do executivo – que já está em sua terceira temporada no
Brasil– é explicado pela queda de mais de 40% na venda de caminhões e
pelo fim dos subsídios do governo para o setor automotivo.
“É a pior crise dos últimos anos: volume caindo, preço estável e
custos aumentando. Estou sendo espremido de todos os lados”, disse
Schiemer, que cortou 500 vagas no mês passado e diz que tem mais 2 mil
funcionários sem trabalho na fábrica.
O executivo admite que a Mercedes-Benz atualmente vê o Brasil com
mais “desconfiança” e faz uma crítica indireta à presidente Dilma, que
defende que o país foi afetado pela crise global.
“Não sei onde enxergam
crise lá fora. O que temos aqui é um problema caseiro”.
O sr. disse aos funcionários em um evento que a Mercedes-Benz vive sua pior crise no Brasil. É verdade?
Sem dúvida, estamos na pior crise dos últimos 20 anos.
Temos vários
problemas.
O primeiro é a queda de mercado.
De janeiro a maio, as vendas
de caminhões caíram 44%, enquanto as de ônibus cederam 27%.
É uma queda
no mesmo patamar do mercado, mas muito expressiva.
As empresas
acreditaram no Brasil e a capacidade instalada excede muito a demanda.
Não conseguimos aumentar preços, porque a concorrência é intensa.
Por
outro lado, a mentalidade inflacionária do Brasil é muito forte e os
custos sobem quase automaticamente.
Hoje tenho o pior cenário possível:
volume caindo, preço estável e custos aumentando.
Estou sendo espremido
de todos os lados. A saída para isso é muito difícil.
Funcionários acamparam na porta da fábrica. O sr. se sente culpado?
Pessoalmente não é nada agradável.
Tenho que pensar que sou
responsável não por 500 pessoas, mas por 11 mil.
Tenho a consciência
tranquila porque tratamos o assunto com transparência.
Desde o ano
passado, demos inúmeras chances para aceitar um PDV (plano de
desligamento voluntário).
Por que a venda de caminhões despencou no Brasil?
O mercado está muito alinhado com o ritmo da economia porque o
transporte de bens no Brasil é feito por caminhão.
Mas, se a economia
não cresce e existe um clima de desconfiança, os empresários param de
investir.
E a primeira coisa que cortam é o caminhão novo.
Além disso, o
governo cortou os subsídios que mantinham os juros baixos e a maior
parte dos caminhões é adquirida com financiamento.
A redução dos
subsídios para a indústria faz parte do ajuste fiscal, mas tem um efeito
no mercado.
O sr. disse que existe um clima de desconfiança.
Por quê?
O país perdeu a previsibilidade.
Nos últimos anos, tivemos muitas
mudanças nas premissas da política econômica e ninguém tem segurança do
que vai acontecer.
Há 10 anos, a inflação estava baixa, as contas
públicas equilibradas e nós sabíamos o que viria pela frente.
Há 20
anos, não tínhamos nada disso.
Acredito que voltamos uns 20 anos no
tempo.
Também não há confiança porque o quadro político é muito
complicado.
O PSDB vota contra suas crenças e o PT também. Você acha que
alguém vai investir nesse cenário? É melhor ficar parado.
(entrevista enviada pelo comentarista Guilherme Almeida)
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