domingo, 28 de junho de 2015

NINGUÉM VAI INVESTIR NO BRASIL, DIZ O PRESIDENTE DA MERCEDES

Raquel Landim
  Folha

Contrariando o discurso morno de dirigentes de multinacionais, o alemão Phillipp Schiemer, presidente da Mercedes-Benz no Brasil, não mede palavras para falar de sua desilusão com o país e com o governo Dilma.

 “O país perdeu a previsibilidade com as mudanças nas premissas da política econômica. Voltamos uns 20 anos no tempo”, disse Schiemer à Folha. “O PSDB vota contra suas crenças e o PT também. Você acha que alguém vai se arriscar a investir?”.

O pessimismo do executivo – que já está em sua terceira temporada no Brasil– é explicado pela queda de mais de 40% na venda de caminhões e pelo fim dos subsídios do governo para o setor automotivo.

“É a pior crise dos últimos anos: volume caindo, preço estável e custos aumentando. Estou sendo espremido de todos os lados”, disse Schiemer, que cortou 500 vagas no mês passado e diz que tem mais 2 mil funcionários sem trabalho na fábrica.

O executivo admite que a Mercedes-Benz atualmente vê o Brasil com mais “desconfiança” e faz uma crítica indireta à presidente Dilma, que defende que o país foi afetado pela crise global. 

“Não sei onde enxergam crise lá fora. O que temos aqui é um problema caseiro”.

O sr. disse aos funcionários em um evento que a Mercedes-Benz vive sua pior crise no Brasil. É verdade?

Sem dúvida, estamos na pior crise dos últimos 20 anos.

 Temos vários problemas.

 O primeiro é a queda de mercado. 

De janeiro a maio, as vendas de caminhões caíram 44%, enquanto as de ônibus cederam 27%.

 É uma queda no mesmo patamar do mercado, mas muito expressiva.

 As empresas acreditaram no Brasil e a capacidade instalada excede muito a demanda.

 Não conseguimos aumentar preços, porque a concorrência é intensa. 

Por outro lado, a mentalidade inflacionária do Brasil é muito forte e os custos sobem quase automaticamente. 

Hoje tenho o pior cenário possível: volume caindo, preço estável e custos aumentando. 

Estou sendo espremido de todos os lados. A saída para isso é muito difícil.

Funcionários acamparam na porta da fábrica. O sr. se sente culpado?

Pessoalmente não é nada agradável. 

Tenho que pensar que sou responsável não por 500 pessoas, mas por 11 mil.

 Tenho a consciência tranquila porque tratamos o assunto com transparência. 

Desde o ano passado, demos inúmeras chances para aceitar um PDV (plano de desligamento voluntário).

Por que a venda de caminhões despencou no Brasil?

O mercado está muito alinhado com o ritmo da economia porque o transporte de bens no Brasil é feito por caminhão. 

Mas, se a economia não cresce e existe um clima de desconfiança, os empresários param de investir. 

E a primeira coisa que cortam é o caminhão novo. 

Além disso, o governo cortou os subsídios que mantinham os juros baixos e a maior parte dos caminhões é adquirida com financiamento. 

A redução dos subsídios para a indústria faz parte do ajuste fiscal, mas tem um efeito no mercado.

O sr. disse que existe um clima de desconfiança.

 Por quê?

O país perdeu a previsibilidade. 

Nos últimos anos, tivemos muitas mudanças nas premissas da política econômica e ninguém tem segurança do que vai acontecer.

 Há 10 anos, a inflação estava baixa, as contas públicas equilibradas e nós sabíamos o que viria pela frente. 

Há 20 anos, não tínhamos nada disso. 

Acredito que voltamos uns 20 anos no tempo.

 Também não há confiança porque o quadro político é muito complicado.

 O PSDB vota contra suas crenças e o PT também. Você acha que alguém vai investir nesse cenário? É melhor ficar parado.

(entrevista enviada pelo comentarista Guilherme Almeida)

Tribuna da Internet