Bernardo Mello Franco
Folha
Para o escritor Frei Betto, o modelo de crescimento da era Lula ajuda
a explicar a rejeição galopante ao PT e a Dilma. Enquanto sobrava
dinheiro, diz ele, o governo apostou na inclusão social pelo consumo e
não investiu o que devia nos serviços públicos, como saúde, transporte e
educação. Agora que a festa acabou, quem pensava ter melhorado de vida
percebeu que boa parte do bem-estar era ilusória.
“Essa inclusão não tinha lastro econômico e criou uma nação
consumista”, afirma o dominicano. “As pessoas estão chateadas porque não
podem mais viajar de avião, ir ao restaurante, fazer a mesma compra na
feira. A raiva vem daí. Tiraram o sorvete da boca da criança”.
Empenhando em lançar na Flip seu 62º livro, “Paraíso Perdido”
(Rocco), Frei Betto também está desiludido com o partido que apoiou em
tantas eleições. “O PT trocou um projeto de Brasil por um projeto de
poder. Agora paga pelos erros que cometeu”, critica. Ele diz que o
petismo está imobilizado pela coalizão que montou para governar. “O PT
construiu uma base fisiológica, não ideológica. Depois do mensalão e do
petrolão, alimentar esse sistema ficou mais difícil”.
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Ex-assessor de Lula no Planalto, o escritor lamenta que o partido
tenha se afastado dos movimentos sociais. “O PT resolveu se apoiar nos
inimigos. Antes, criticava o mercado e o Congresso dos 300 picaretas.
Agora é refém dos dois e não sabe como sair do impasse”.
Em Paraty, ele trocou ideias com o romancista Leonardo Padura e
comparou o que vem pela frente ao chamado período especial de Cuba, após
o fim da União Soviética. “Guardemos o pessimismo para dias melhores”,
brinca. A sério, Frei Betto diz que a situação é “muito crítica”. “Não
vejo uma luz no fim do túnel”.
O ajuste fiscal, avisa o escritor, só vai agravar a insatisfação dos
mais pobres e a rejeição ao governo e ao PT. “A Dilma só tem uma saída:
povo na rua. Mas agora quem vai para a rua defendê-la?”, questiona.
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