Em matéria de política exterior no geral, e sobre o Oriente Médio em
particular, Donald Trump, logo depois de eleito o novo presidente dos
Estados Unidos, se destacará como um dos homens mais imprevisíveis a
ocupar esta posição desde que seu país começou a empregar uma política
imperial ultramarina, em finais do século 19.
Durante a campanha eleitoral, Trump se contradisse permanentemente e
mudou de posição ou de tom sobre numerosas questões. Se, contudo, é
julgado por certos temas chave que repetiu diversas vezes durante o
último ano, o que segue é o que se pode adivinhar nestes momentos sobre a
forma como sua presidência afetará o Oriente Médio.
O povo sírio será o primeiro a sofrer as consequências desta eleição.
As portas dos Estados Unidos serão fechadas para as pessoas refugiadas
que queiram tentar se instalar por lá, com exceção, quiçá, dos cristãos
na medida que a agitação de Trump contra as pessoas refugiadas sírias
está centrada no tema da islamofobia.
Na busca de pôr um fim ao fluxo de refugiados e refugiadas
provenientes da Síria, Trump planejou a criação de uma “zona de
segurança” nas fronteiras do país, nas quais as pessoas sírias
desterradas seriam concentradas em vez de autorizadas a ir para o
estrangeiro como refugiadas. Presumiu fazer os Estados do Golfo pagarem
por esta operação da mesma forma que pretende fazer com que o México
pague o muro que tem intenção de construir na fronteira entre este e o
seu país.
Logo, Trump inaugurará uma nova política de amizade e de colaboração
com o presidente russo Vladimir Putin, fundada em um acordo com os
interesses russos. No Oriente Médio, isto envolve um reconhecimento do
papel da Rússia na Síria como positivo, a apoiar o regime de Bashar
Al-Assad como representante do mal menor.
Logicamente, implica que os Estados Unidos exijam de seus aliados
tradicionais na região que deixem de apoiar a oposição armada síria.
Washington apoiará com Moscou um “governo de coalizão” sírio que
compreenda membros conciliadores da “oposição”. Isto poderá abrir o
caminho a uma colaboração dos Estados Unidos com o regime de Assad em
nome da “guerra contra o terror”.
Prosseguindo uma política favorecedora dos “homens fortes” no poder,
que compartilha com Putin, Trump tentará melhorar as relações que
Washington mantém tanto com o presidente egípcio Abdel Fattah el-Sissi
como com o presidente turco Recep Tayyip Erdogan.
Poderia tentar reparar os “pratos quebrados” dos dois homens e
persuadi-los de que unam seus esforços contra um “terrorismo” que
aceitará a definição de cada presidente, segundo o que considere como
terrorismo em seu próprio país.
Na medida em que Trump está disposto a se enfrentar com o Irã e
revogar o acordo sobre o tema nuclear negociado pela administração
Obama, poderia inclusive tentar seduzir a Arábia Saudita para que se
some ao que poderia aparecer como o triângulo sunita de Ancara, Cairo e
Riad - apoiado por Washington.
É aí onde reside a principal contradição da visão de Trump para o
Oriente Médio (enquanto sua posição hostil a China é a principal
incoerência de sua visão global): superar esta visão implica arrastar
tanto Moscou como o regime Assad a uma ruptura com Teerã.
Por fim, outro “homem forte” da região cujas relações com Washington
melhorarão muito com uma presidência de Trump é Benjamin Netanyahu.
Outra vítima direta da eleição de Trump será, portanto, o povo
palestino, na medida em que Netanyahu terá as mãos mais livres para
“tratar” com eles do que qualquer outro primeiro-ministro israelense
desde Ariel Sharon, após os atentados de 11 de setembro de 2001.
Correio da Cidadania