sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Procurado pela Interpol, Assange reaparece e critica censura ao WikiLeaks

O homem mais procurado do momento, Julian Assange, criador do site WikiLeaks, reapareceu na imprensa nesta sexta-feira para responder perguntas de internautas do jornal britânico "The Guardian". Questionado desde as ameaças de morte que recebe a possíveis vazamentos sobre vida extraterrestre, Assange fez duras críticas à pressão dos governos ocidentais, mas fugiu quando um ex-diplomata o perguntou sobre as consequências dos vazamentos para o trabalho da diplomacia.

Assange, que, segundo informações da imprensa, pode estar no Reino Unido, é alvo de uma ordem de prisão emitida pela justiça sueca por um suposto caso de estupro, o que originou nesta semana uma notificação vermelha da Interpol.


Todo isso coincide com a publicação desde domingo passado de mais de 250 mil mensagens diplomáticas americanas que provocou a ira dos Estados Unidos e gerou reações em todo o mundo, especialmente dos governos citados nos telegramas.

Assange criticou duramente a censura que o site tem sofrido dos governos ocidentais e afirmou que o discurso de liberdade de expressão característico dos governos é vazio --e gratuito.

"O Ocidente tem fiscalizado suas relações básicas de poder através de uma teia de contratos, empréstimos, participações, holdings e assim por diante. Em tal ambiente, é fácil falar sobre ser "livre", porque uma mudança na política raramente leva a qualquer mudança nestes instrumentos básicos", disse Assange.

"O discurso ocidental, como algo que raramente tem algum efeito sobre o poder, é gratuito". 

Em Estados como a China, há uma censura generalizada, porque o discurso ainda tem o poder e o poder está com medo dele. Devemos sempre olhar para a censura como um sinal econômico que revela o poder potencial de expressão nesse país".

O criador do site afirmou que seu objetivo é dar a importância devida às fontes de informações confidenciais, "sem as quais os jornalistas seriam nada". Ele dá crédito ainda à tese de que o analista de inteligência do Exército dos EUA no Iraque Bradley Manning, 22, estaria por trás dos vazamentos. "Se realmente este for o caso, como alegado pelo Pentágono, de que o jovem soldado está por trás de alguns dos recentes vazamentos, ele então é, sem dúvida, um herói sem paralelo".

Manning já estava preso sob a acusação de ter passado ao WikiLeaks um vídeo de 2007 que mostrava um ataque de helicóptero que deixou 12 mortos no Iraque, inclusive dois jornalistas da agência de notícias Reuters. Ele foi preso novamente e aguarda julgamento desde os recentes vazamentos do WikiLeaks sobre a guerra do Afeganistão. Num chat pela Internet, Manning teria confessado a um hacker que havia copiado o material diretamente do SIPRNet, gravando-o sobre músicas de Lady Gaga em um CD.

O criador do WikiLeaks falou ainda das ameaças de morte que tem recebido e afirmou que está tomando medidas de segurança. "As ameaças contra nossas vidas são de domínio público. No entanto, estamos tomando as precauções apropriadas até o limite do que podemos por estar tratando com uma superpotência", respondeu.

Assange ignorou, contudo, a longa pergunta de um intitulado ex-diplomata britânico, que perguntou por que o criador do WikiLeaks não deveria ser diretamente responsabilizado se a próxima crise internacional ficar sem solução por medo dos diplomatas de terem segredos revelados.

"Se você cortar a vasta carta editorial à questão singular que realmente perguntou, eu ficaria feliz em dar a minha atenção", respondeu.

Veja os principais trechos da entrevista aos leitores do "Guardian"

PROIBIDO DE VOLTAR PRA CASA

Um dos leitores perguntou se o australiano Assange não desejava voltar para seu país natal. Ele afirmou "sentir muita falta" de seu país, mas disse que, nas últimas semanas, a premiê australiana, Julia Gillard, e o procurador-geral, Robert McClelland, "deixaram claro que não apenas meu retorno é impossível, mas que eles estão trabalhando ativamente para ajudar os Estados Unidos em seus ataques contra mim e nosso pessoal".

"Isto traz em questão o que significa ser um cidadão australiano. Significa alguma coisa? Ou nós seremos tratados todos como David Hicks [australiano membro do grupo radical Taleban] na primeira oportunidade meramente para que os políticos e diplomatas australianos possam ser convidados para as melhores festas da embaixada americana?".

EXTRATERRESTRES

Assange foi questionado ainda se já recebeu documentos sobre Ovnis e extraterrestres. "Muitas pessoas estranhas nos mandam e-mail sobre Ovnis e como eles descobriram o antiCristo quando conversavam com suas ex-mulheres em uma festa no jardim, em uma planta", revelou, lembrando que estes relatos não poderiam ser publicados porque não obedecem às regras do WikiLeaks de ser original e não ser de autoria de quem os envia.

"Contudo, é bom ressaltar que parte dos telegramas ainda a serem publicados há efetivamente referência a Ovnis", completou.

TESTE DE SERVIDORES

Assange afirmou ainda que, desde 2007, o WikiLeaks deliberadamente usa servidores em jurisdições onde haja suspeita de censura "para separar a retórica da realidade". Ele afirma que a americana Amazon, que nesta quarta-feira (1º/12) expulsou o site de seus servidores, é um destes casos.

ROSTO PÚBLICO

"Inicialmente eu tentei duramente que a organização não tivesse um rosto, porque eu não queria que os egos participassem de nossas atividades", explicou Assange, questionado sobre porque decidiu se mostrar ao público.

"No entanto, isto levou rapidamente a curiosidade tremenda sobre quem éramos e alguns indivíduos falando que o nós representava. No final, alguém deve ser responsável perante o público e apenas uma liderança que está disposta a ser publicamente corajosa pode sugerir genuinamente que as fontes assumam riscos para o bem maior. Nesse processo, eu me tornei o pára-raios". Folha Online