Quase metade da Amazônia brasileira pertence hoje à categoria de área protegida por lei contra a devastação, embora essas reservas ainda sofram com gestão precária e com a falta de pessoal para monitorá-las.
Essa dicotomia entre copo meio cheio e meio vazio talvez seja a principal mensagem de um dos mais abrangentes relatórios sobre as áreas protegidas amazônicas, que acaba de ser publicado pelo ISA (Instituto Socioambiental) e pelo Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia).
Somando terras indígenas e os dois principais tipos de unidades de conservação (as de proteção integral, cujo nome já diz tudo, e as de uso sustentável, nas quais é possível a extração controlada de madeira, por exemplo), 43,9% do território amazônico está protegido.
É pouco mais do que um quarto de todas as terras do Brasil. E, no caso de alguns Estados, a proporção é ainda mais expressiva: Amapá, Roraima, Pará e Amazonas possuem mais da metade de seu território nessa categoria.
A inclusão das terras indígenas na conta faz um bocado de sentido, embora os povos que habitam tradicionalmente essas áreas tenham o direito de caçar e pescar nelas, por exemplo.
Vários levantamentos apontam que formalizar a posse de certas áreas por seus habitantes nativos é uma excelente maneira de evitar o desmatamento nelas.
E, de fato, a taxa de desmate de 1998 a 2009 é a menor nas terras indígenas: cerca de 1,5% da área.
Em unidades de conservação integral, como parques nacionais, esse número no mesmo período foi de 2,1%. Terras indígenas e unidades de conservação contribuem de modo quase parelho para o número total de áreas protegidas na Amazônia.
BOM NO PAPEL
Eis, aliás, outra conclusão clara do trabalho: a definição de uma região como área protegida tem um efeito relativamente fácil de medir sobre o avanço do desmatamento. Basta dizer que a perda de florestas nas áreas protegidas em uma década, cerca de 12 mil km2, foi semelhante ao que se desmatou na Amazônia toda em apenas um ano, o de 2008 ± que na verdade foi um dos menos devastadores do período.
É claro que é necessário fazer algumas ressalvas a isso.
Certas áreas protegidas são criadas em locais remotos, onde há pouca pressão da fronteira agrícola, por exemplo. Mesmo assim, trata-se de um fenômeno conhecido e esperado, o dos ªpaper parksº (parques de papel).
A ideia é que a simples canetada criando uma reserva já é capaz de dissuadir, em parte, a ação de desmatadores ilegais.
Mas são mesmo parques de papel? Em muitos casos sim, indica a pesquisa.
Veja-se o caso das unidades de conservação. Nelas, a média de funcionários alocados é de uma pessoa para cada 1.871 km² de Amazônia ±ou mais do que todo o município de São Paulo para um único sujeito monitorar.
Do mesmo modo, hoje só há um plano de manejo aprovado oficialmente para metade dessas unidades de conservação.
É o plano de manejo que vai definir como as unidades vão funcionar, e é especialmente importante nas de uso sustentável, pois determina quantas árvores de que idade podem ser cortadas, quais frutos podem ser coletados, entre outras formas de usar a floresta sem destruí-la.
O relatório foi coordenado por Adalberto Veríssimo e Mariana Vedoveto, do Imazon, e por Alicia Rolla e Silvia de Melo Futada, do ISA. FOLHA