Depois de ter aceitado complacentemente os seguidos desrespeitos por parte de sua sócia venezuelana PDVSA ao acordo para a construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, a Petrobrás agora anuncia um novo compromisso, em termos "irrevogáveis e irretratáveis": ou sua parceira cumpre a parte que lhe cabe na sociedade ou terá de se retirar dela. Espera-se que, desta vez, o compromisso seja cumprido.
Fruto da demagogia terceiro-mundista do ex-presidente Lula, que pretendia estabelecer uma "aliança estratégica" do Brasil com a Venezuela do caudilho populista Hugo Chávez, o acordo firmado em 2005 para a construção da refinaria previa que a Petrobrás arcaria com 60% dos custos e a PDVSA, com os restantes 40%. Mas, com cerca de 40% das obras já executadas, a PDVSA ainda não entrou com nenhum centavo, apesar das muitas reuniões e acertos entre as partes nos últimos anos.
Esperava-se que, diante de tantas protelações, a Petrobrás anunciasse em meados de julho sua decisão de, como faz desde o início, tocar sozinha até seu final essa obra necessária para o atendimento da crescente demanda interna de derivados de petróleo. O que se decidiu, na ocasião, porém, foi empurrar o problema com a barriga. Agora, outra oportunidade está sendo oferecida à PDVSA para manter a parceria, com a concessão de novo prazo para que, afinal, ela faça o que já deveria ter feito há muito tempo ou saia do negócio
O novo compromisso assumido pela estatal venezuelana, com as tais condições "irrevogáveis", prevê que, até 30 de setembro, ela terá de apresentar as garantias ao BNDES para assumir sua parte, correspondente a R$ 3,6 bilhões (40% do total) da dívida de R$ 9 bilhões já contraída para a execução da obra. Se as garantias forem aceitas, a PDVSA deverá depositar o valor, em favor da Petrobrás, até o dia 30 de novembro. Além disso, até essa data, a estatal venezuelana terá também de depositar 40% do total já investido diretamente por sua parceira brasileira.
Não será fácil para a PDVSA cumprir sua parte na obra. Ela está envolvida num escândalo de apropriação indébita do equivalente a quase US$ 500 milhões do fundo de pensão de seus empregados. O dinheiro teria sido aplicado numa pirâmide financeira semelhante à que levou à condenação do financista americano Bernard Madoff a 150 anos de prisão.
A PDVSA foi transformada por Chávez na principal fonte de recursos para seus programas de cunho populista, que vão de investimentos nas áreas de saúde e educação, até artes e competições esportivas internacionais, passando por importação de alimentos e ajuda financeira para Cuba. Em razão de seu intenso uso político e da má gestão, seus resultados econômico-financeiros são cada vez piores.
A sociedade com a Petrobrás prevê que a refinaria em construção em Pernambuco deverá processar 220 mil barris por dia, sendo 50% de óleo pesado da Bacia de Campos e o restante proveniente da Venezuela. Uma tentativa anterior de cooperação entre as duas empresas, para a exploração de petróleo do Campo de Carabobo, na Bacia do Orinoco, foi abandonada pela Petrobrás, que considerou o investimento inviável.
Quanto à Refinaria Abreu e Lima, o interesse brasileiro é prioritário. Ela é uma das prioridades no plano da Petrobrás para o aumento de sua capacidade de refino até 2020. A empresa estima que, se novas refinarias não entrarem em operação nos próximos nove anos, o Brasil será obrigado a importar 40% da gasolina que consome (hoje, importa 5%). "Seria uma tragédia ficarmos altamente dependentes do exterior", disse ao Estado o diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa.
Pelas consequências danosas dessa parceria - fruto de um gesto demagógico de Lula, cuja utilidade financeira e importância estratégica nunca foram comprovadas - e das seguidas protelações da PDVSA, ela já deveria ter sido abandonada pela Petrobrás, que tem recursos para fazer sozinha o que precisa ser feito para não prejudicar o País.
ESTADÃO