Percival Puggina
Outro dia, escrevi sobre o comportamento abusivo de setores sociais
que se consideram corregedores da opinião pública.
Referia-me a grupos
empenhados em nos instruir segundo seus próprios padrões de conduta.
Estranhamente, percebi hoje, deixei de lado os autores e diretores de
novelas da Rede Globo.
Como fui esquecê-los? A explicação é simples: há
muitas décadas não assisto novela alguma. Mas sei que foi constante e
persistente o trabalho desses profissionais para impor à sociedade suas
pautas e suas posições político-ideológicas, através da audiência da
maior emissora de tevê do país.
Serviram à população, lentamente, doses crescentes de drogas que a
tornassem dependente e destruíssem seus princípios e seus valores.
Muitos dos atuais males vividos pelas instituições nacionais, partindo
da família, passando pelo sistema de ensino, até chegar à política e às
instituições do Estado, resultam, em boa parte, do longo processo sobre o
qual aqui escrevo.
A discussão sobre ele é antiga e se resume,
essencialmente, em saber quem reflete o quê: a novela expressa a vida ou
a vida reflete a novela?
SEM DÚVIDA
Essa dúvida eu nunca tive. Durante anos participei de um grupo que
fazia palestras sobre a formação do senso crítico, para criar mecanismos
de defesa no ambiente familiar e escolar, construindo trincheiras de
consciências bem formadas.
Com o passar dos anos, o grupo se desfez por
motivos que nada tiveram a ver com a tarefa em si. Mas sinto uma ponta
de orgulho em saber que, há tanto tempo, tivemos claro discernimento
sobre para onde a nação estava sendo conduzida.
Em entrevista que li lá
pelo início dos anos 90, um dos maiores da profissão, filiado ao PCB,
Dias Gomes, admitiu explicitamente que sua atividade profissional sempre
estivera orientada nessa direção, inclusive durante os governos
militares.
Por todas essas e por muitas outras, a matéria da Veja sobre a reação
de Gilberto Braga e Dennis Carvalho, respectivamente autor e diretor da
novela Babilônia, me fez muito feliz.
Encantou-me o desalento da dupla
que quis aumentar um pouco mais a dose da droga que serve à sociedade e
obteve como resposta uma sólida rejeição. A novela virou o maior fiasco
do horário em toda a história da TV Globo.
Mas o melhor de tudo foi ler
que a dupla está estarrecida com a “caretice” da população. “Nós estamos
no século 21, em 2015, e de repente as pessoas ficam chocadas com
coisas que não chocavam antigamente”, lamuriaram-se.
AGORA, MUDOU TUDO
Mas não é a novela que imita a vida, senhores?
Agora mudou tudo? A
rejeição da sociedade a essa novela mostra que sempre foram vocês que
estiveram conduzindo a população através da falta de caráter e limites
de seus personagens.
E agora, que os telespectadores lhes dizem –
Basta!” – têm a audácia de atribuir a rejeição ao “politicamente
correto”? Mas essa maldição do politicamente correto foi outra
construção do mesmo plano sinistro que conduziam!
Esse ardiloso uso do poder da televisão também chega ao fim. Aquelas
três novidades tecnológicas que mencionei outro dia – internet,
smartphones e redes sociais – estão derrubando o comércio de droga à
população através da TV.
As pessoas estão sabendo mais, lendo outras
coisas, assistindo vídeos de formação, ampliando seu discernimento e
percebendo que com a perda da noção de limites são perdidos, também,
muitos dos mais valiosos bens de que todos podemos dispor para nossa
felicidade.
Tribuna da Internet