sábado, 6 de junho de 2015

O FRACASSO DE "BABILÔNIA" E AS DECLARAÇÕES DE GILBERTO BRAGA

Todos já sabem que "Babilônia" é o maior fracasso do horário nobre da Globo e que os baixos índices de audiência são uma verdadeira dor de cabeça para a emissora, que comemora 50 anos em 2015. Assim como é de conhecimento geral que todas as mudanças feitas na novela até agora não surtiram efeito algum e ainda pioraram o que já não estava bom. Porém, todo este conjunto problemático ficou mais evidente depois da entrevista que Gilberto Braga deu a "O Globo", na Revista da TV, no último domingo de maio (31).

 O autor ---- que escreve a novela junto com Ricardo Linhares e João Ximenes Braga ---- não havia se pronunciado a respeito da produção desde a sua estreia. Após um longo período calado, ele finalmente quebrou o silêncio em uma longa e ótima conversa. Gilberto sempre foi um escritor polêmico com suas declarações, tanto em relação aos colegas autores, quanto em torno dos atores e de suas próprias novelas. Ele não é de meias palavras e fala mesmo ---- característica parecida (para não dizer igual) a de Aguinaldo Silva, diga-se. Tanto que esta sua recente entrevista não chega a ser surpreendente para quem já leu as várias outras matérias que contaram com sua ilustre participação ao longo destes anos.
Gilberto Braga admitiu a preocupação com a situação 'catastrófica' (segundo o próprio) e disse que pediu para antecipar o grupo de discussão sobre a trama. Foi, inclusive, a partir das informações obtidas neste famigerado grupo (todo folhetim passa por esta 'análise' feita pela própria emissora através de diferentes perfis de telespectadores) que as mudanças no enredo começaram, mexendo, inclusive, nos poucos acertos da história.
O autor não esconde sua insatisfação com a rejeição e declarou que o Brasil encaretou, no que está coberto de razão.
Em meio ao politicamente correto, é impossível não constatar que o conjunto de impedimentos em torno do conteúdo exibido atrapalha qualquer folhetim, independente do horário. Levando em consideração, ainda, que os programas policialescos dos fins de tarde não sofrem qualquer tipo de censura em cima do que mostram (mortes, violência e afins) porque são considerados produtos jornalísticos e não de entretenimento. Porém, o autor se equivoca ao atribuir isso a um dos motivos para o fracasso da trama.

O beijo gay realmente provocou fortes reações, mas se a história tivesse conquistado como um todo esta questão não afetaria em nada o desempenho da novela. Vale lembrar novamente a rejeição ao par homossexual de "Império" (Cláudio e Leonardo), que não prejudicou a aceitação da história de Aguinaldo Silva. E o autor ainda disse que escreveu um selinho entre Estela e Teresa, mas que Fernanda Montenegro sugeriu um beijo mais longo. Mas a cena em si não teve nada demais e o erro foi terem exibido logo no primeiro capítulo, praticamente 'jogando' tudo diretamente pro telespectador, antes de fazê-lo se envolver com o casal. A relação das duas é tão bonita e bem construída que seria bem possível haver uma afeição a elas ao longo da história.

Gilberto se equivoca também ao declarar que o beijo de Félix e Niko só foi bem aceito porque os atores não eram 'estrelas históricas da tv e do teatro'. Mateus Solano e Thiago Fragoso realmente não podem ser comparados a Nathalia Timberg e Fernando Montenegro, porém, eles já haviam feito vários 'galãs' em novelas, e o casal foi surpreendente. Tanto a química, quanto a história que caiu nas graças do público, que praticamente exigiu um beijo no final. Portanto, também havia o risco de ocorrer uma rejeição. Como ocorreu inicialmente, inclusive, com Clara e Marina em "Em Família", porque Manoel Carlos colocou a fotógrafa vivida por Tainá Muller para dar em cima de outra, que era casada, sem nem ao menos se importar com as consequências.

A trama 'muito pesada' também foi motivo de questionamento. Entretanto, esta é mais uma razão inexistente. Toda novela tem maldade e os últimos sucessos do horário tiveram, inclusive, várias situações perversas. Afinal, não é assustador uma mulher humilhar e depois jogar uma criança em um lixão como Carminha (Adriana Esteves) fez com Rita (Mel Maia) em "Avenida Brasil"? Ou então um empresário rico roubar a filha da própria irmã e jogá-la em uma caçamba de lixo como Félix (Mateus Solano) fez com Paloma (Paolla Oliveira) em "Amor à Vida?" E estes dois marcantes momentos ocorreram logo no primeiro capítulo; ou seja, se fosse determinante, provocaria repulsa da audiência logo no início. Só que não provocaram porque os enredos prenderam a atenção e fizeram sucesso, o que não ocorreu com "Babilônia", pois faltou um fio condutor e conflitos que se sustentassem a contento.

Culpar os paulistas pelo fracasso da novela também é injusto. Se a trama estivesse com ótima audiência nos demais estados, a crítica faria todo sentido, mas não é o caso. O jornal Estadão, inclusive, fez questão de fazer um levantamento sobre os índices 'gerais' e a situação não é muito diferente. Até agora "Babilônia" tem 26 pontos de média nacional e 25,5 de média em SP (mercado que realmente vale para a publicidade e a própria Globo ---- esta situação, aliás, deveria ser revista uma vez que a média geral seria bem mais coerente). Estes números são abaixo dos 30 pontos de "Em Família", que era (até então) o maior fracasso da faixa. E no Rio de Janeiro e em Porto Alegre (onde os índices são sempre maiores que SP) as médias diminuíram ainda mais depois das mudanças (agora está com 27,9 e 30 pontos, respectivamente). Já em Belo Horizonte o Ibope marca apenas 21. Portanto, a rejeição foi geral.

Aliás, este comentário sobre a população paulistana foi justamente o que provocou mais repercussão. Isso porque ele chamou os paulistas de 'esquisitos'. A razão para a crítica, além da baixa audiência da novela, foi o fato dos telespectadores terem amado o Jamanta (vivido magistralmente pelo ator Cacá Carvalho), um perfil que o 'resto do país detestava', incluindo ele ----- "Não sei escrever para quem gosta de Jamanta", disse. Só que o personagem que sofria de problemas mentais não era só querido neste estado, uma vez que fez um imenso sucesso por todo o Brasil. Tanto que virou um dos grandes destaques de "Torre de Babel" e voltou anos depois em "Belíssima". Mas na verdade o autor quis apenas fazer uma referência ao humor popularesco que ele de fato nunca dominou ---- e nem foi para atacar Silvio de Abreu, pois os dois são amigos de longa data. A comprovação deste seu 'problema', inclusive, é o núcleo cômico da atual novela encabeçado por Marco Veras, Gabriel Braga Nunes, Igor Angelkorte e Maria Clara Gueiros, que nunca teve graça.

Entre outras partes 'polêmicas', o autor ainda declarou que sofre uma humilhação pública perdendo para "I love Paraisópolis" e ficou com pena das mulheres que têm tesão pelo Marcos Pasquim, transformando o Carlos Alberto em hétero ---- uma das muitas alterações forçadas da história. Alguns o acusaram de torcer para o fracasso da trama das sete, mas foi apenas um desabafo irônico e pertinente porque novela do horário nobre não pode mesmo perder para uma cujo público é bem menor --- em se tratando de números de televisores ligados.

E é sempre válido ressaltar que nem sempre audiência implica em qualidade, por mais repetitivo que seja fazer esta observação. Há tramas com Ibopes altíssimos que não foram boas e outras com números fracos que se apresentaram de forma impecável. Se "Babilônia" fosse uma novela ótima, os números baixos seriam citados, obviamente, mas as qualidades do folhetim com certeza seriam mencionadas. Entretanto, infelizmente, a obra faz jus ao retorno que tem recebido do público. Completamente perdida e com vários perfis e tramas alteradas de forma abrupta, o enredo (que já apresentava sérias deficiências) foi aniquilado de vez. Só restaram mesmo algumas esporádicas cenas merecedoras de elogios (estas quase sempre protagonizadas por Glória Pires, Arlete Salles, Adriana Esteves e Fernanda Montenegro) em meio a um amontoado de sequências desinteressantes.

As declarações de Gilberto Braga provocaram uma 'polêmica' exagerada, mas a repercussão da ótima entrevista feita pelo repórter Zean Bravo acabou sendo positiva porque trouxe a atual novela das nove de volta para o foco, levantando bons debates sobre o atual período do politicamente correto e a respeito dos problemas de "Babilônia", uma produção que lamentavelmente se apresenta de forma totalmente equivocada e que ainda terá três meses pela frente.

De Olho Nos Detalhes