domingo, 13 de maio de 2012

'Ciudad del Este era nosso shopping'


Toda criança que vivia no oeste do Paraná nos anos 1980 usou um tênis que chamávamos de "chinesinho"; um modelo amarelo com uma estrela azul, feio, mas que atraía qualquer mãe pelo preço baixo.

Da mesma forma, na volta às aulas eram comuns os estojos com lápis multicoloridos, borrachas dos mais variados tamanhos e outras quinquilharias compradas, invariavelmente, no Paraguai.

Para nós, ir a Ciudad del Este na época de inflação galopante e mercado fechado era programa familiar, como o paulistano vai à praia. Programa de quase todos os meses. A cidade era nosso shopping.

Nosso engarrafamento era na BR-277 - no meu caso, nos quase 150 quilômetros que ligam Cascavel, onde cresci, a Foz do Iguaçu. Já demoramos 12 horas para vencer esse trecho, tamanho era o movimento às vésperas do Natal.

Era a época em que de tudo se comprava no Paraguai: de balas e chicletes a roupa de marca, material escolar, brinquedos, pneus, aparelhos de som, videogames, videocassetes (quando ainda existiam). Sempre com o cuidado para não comprar gato por lebre, ou tijolos por eletrônicos - conheço quem descobriu blocos de construção ao abrir o pacote em casa.

E bebidas. Fazia sentido para o bolso rodar 300 quilômetros apenas para comprar um litro de uísque ou três caixas (daquelas antigas, de 24 latas cada) de cerveja brasileira tipo exportação.

Depois vieram o Plano Real, a estabilização econômica, a maior fiscalização na fronteira, e as idas ao Paraguai ficaram cada vez mais escassas.

O brasileiro que ganhou dinheiro agora compra em Miami, a nova classe média não quer saber de quinquilharias.

O comércio do lado de lá sentiu o baque. Ou acompanha essa evolução, ou nenhuma "Black Friday" será suficiente para retomar o movimento frenético que já existiu na Ponte da Amizade.

FOLHA