segunda-feira, 9 de abril de 2012

Foco no Facebook marca 1º ano de Larry Page como chefe do Google


Quando substituiu seu mentor Eric Schmidt como CEO do Google em abril do ano passado, Larry Page insistiu que a companhia deveria ser mais agressiva em conter a ameaça da crescente popularidade do Facebook.

Page respondeu com uma cruzada de rede social que ainda está reformulando o Google em seu aniversário de um ano como executivo-chefe da empresa, ocorrido na quarta-feira (4).

A obsessão pelo Facebook já levou à criação pelo Google de sua própria rede social, o Google+, e inspirou mudanças na política de privacidade de seus serviços e nos resultados das pesquisas do site.

Essas mudanças levantaram questões sobre se a empresa mais poderosa da internet abandonou seu lema "Don't Be Evil" ("Não Seja Mau", em tradução livre) para proteger seu império de publicidade on-line.

"O Facebook acordou o Google para suas deficiências no aspecto social da internet. Não era algo que poderia ser ignorado", diz Steven Levy, cujo livro "In The Plex" (lançado no Brasil como "Google - A Biografia") fornece uma visão interna das origens e da evolução do Google ao longo de 14 anos.

VANTAGEM COMPARATIVA

A preocupação com o Facebook pode parecer um exagero, dado o domínio do Google nos lucrativos mercados de pesquisa e publicidade da internet. No ano passado, o Google vendeu US$ 36,5 bilhões em publicidade - dez vezes mais que os US$ 3,2 bilhões do Facebook.

Mas Page viu que o Facebook tem conquistado uma vantagem comparativa que pode derrubar o Google.

Desde seu início, em 2004, o Facebook vem armazenando informações valiosas sobre círculos sociais e interesses das pessoas. O volume de dados esclarecedores derramados por usuários no Facebook se multiplicou com a popularidade do serviço.

Isso tem proporcionado ao Facebook um meio de direcionar anúncios com mais precisão e fornecer conteúdo ligado a hábitos e gostos do usuário.

O Google não pode usar a maioria dessas informações para refinar seu mecanismo de pesquisa e outros produtos, e é por isso que desenvolveu sua própria rede social.

BATALHA POR USUÁRIOS

Desde seu lançamento, há nove meses, o Google+ atraiu mais de 100 milhões de usuários. Embora menor que os 845 milhões de usuários do Facebook, o número é muito maior que a contagem do Facebook nesse estágio de vida.

Mas o Google+ ainda não provou que consegue prender a atenção de seus usuários. Os visitantes têm gastado em média apenas alguns minutos por mês na rede social em comparação a seis a sete horas no Facebook, de acordo com a comScore.

Ainda assim, o Google+ e outras ferramentas sociais introduzidas desde que Page assumiu permitem à empresa aprender mais sobre a vida de seus usuários - como o Facebook tem feito por anos em seu ponto de encontro on-line.

Agora, o Google pode tentar usar um pouco desse conhecimento para vender mais anúncios, a fonte de praticamente todas as suas receitas.

ABERTURA DE CAPITAL

A ameaça do Facebook pode se tornar ainda maior depois que a empresa fizer sua IPO (oferta pública inicial de ações), o que deve acontecer no mês que vem.

A IPO deverá levantar US$ 5 bilhões e gerar publicidade gratuita que pode atrair ainda mais o tráfego para o Facebook. A oferta de ações também vai ofuscar a estreia do Google feita em 2004 no mercado de ações, a maior para uma empresa de internet dos EUA até hoje.

O Google disse que Page estava muito ocupado para dar entrevistas sobre seu último ano como CEO, um papel que ele recuperou após se render ao leme de Schmidt em 2001. Ele havia sido o executivo-chefe durante os três primeiros anos da empresa, mas os primeiros investidores exigiram um líder mais experiente.

Schmidt, agora presidente-executivo do Google, disse no ano passado que sua incapacidade de desafiar mais seriamente o Facebook foi um dos seus maiores erros.

MUDANÇAS ESTRUTURAIS

Quando assumiu o cargo de CEO, Page rapidamente mostrou qual era sua prioridade ao mover os escritórios executivos do Google para o mesmo edifício da equipe que trabalha no Google+.

Ele também amarrou uma parte dos bônus aos funcionários ao sucesso do Google+ e eliminou o que considerava ser distrações desnecessárias, fechando mais de 20 serviços menos populares da empresa - incluindo uma iniciativa de digitalizar registros de saúde.

"Larry é impulsionado pela sua paranoia pelo Facebook. Claramente, são duas empresas em guerra uma com a outra", diz Ken Auletta, que teve de conhecer Page ao escrever seu livro sobre a empresa, "Googled: The End of the World As We Know It" ("Googlado: O Fim do Mundo Como O Conhecemos", em tradução livre, e ainda sem edição em português).


PRÓXIMOS DESAFIOS

Page tem muitos outros desafios a enfrentar em seu segundo ano de reinado.

O Google está lutando contra investigações regulatórias nos EUA e na Europa sobre seu negócio e sua política de privacidade. Seu sistema operacional para smartphones e tablets, o Android, está em guerra com a Apple - e seu iOS - no cada vez mais importante mercado de dispositivos móveis. E a empresa está perto de completar a maior aquisição de sua história - a compra por US$ 12,5 bilhões da divisão da Motorola de celulares e tablets -, pendente de aprovação do governo chinês após ter conseguido o aval em todos os outros lugares.

Page também está tentando conquistar Wall Street.

Embora o Google esteja mais próspero do que nunca, o preço das ações não manteve o ritmo de crescimento do setor de tecnologia. Alguns investidores têm perdido o interesse na empresa devido ao aumento das despesas do Google com Page no comando. Outros ficaram alarmados pela queda nos preços pagos pelas pesquisas patrocinadas do Google no ano passado.

O preço das ações da empresa subiu 9% desde que Page tornou-se CEO, abaixo dos 12% de ganho do índice de empresas de tecnologia, o Nasdaq. O índice S&P 500, que lista as 500 maiores empresas da bolsa americana e inclui o Google, aumentou 6% no mesmo período.

CONTRARIANDO PRINCÍPIOS

Algumas das táticas do Google para enfrentar o Facebook têm sido interpretadas como sinais de que ele está se transformando em uma empresa cruel, disposta a proteger seu negócio a todo custo.

Isso é algo que Page e o cofundador Sergey Brin prometeram que nunca iria acontecer quando o Google apresentou seus planos de abrir o capital em 2004. Em uma carta aos investidores, Page expôs as razões de o Google adotar o lema "Don't Be Evil" ("Não Seja Mau", em tradução livre) como um dos seus princípios orientadores.

"Acreditamos fortemente que estaremos bem servidos a longo prazo (...) como uma empresa que faz coisas boas para o mundo mesmo que tenhamos de renunciar a alguns ganhos a curto prazo", escreveu Page.

A sinceridade desses compromissos está sendo questionada, com o Google escavando cada vez mais fundo atrás de dados pessoais dos usuários.



POLÍTICAS DE PRIVACIDADE

A recente mudança na política de privacidade do Google desencadeou uma grande gritaria. Cerca de um mês atrás, o Google unificou 60 políticas de privacidade diferentes para unir toda a informação pessoal disponível dos usuários que estão registrados na maioria de seus serviços.

O Google explicou a mudança como uma abordagem mais simples que beneficiaria seus usuários, mas também reconheceu que a mudança permitiria à empresa traçar um perfil mais significativo para anunciantes que queiram se conectar a potenciais consumidores.

Outra reação sobre privacidade surgiu de uma pesquisa publicada por graduandos da Universidade Stanford em fevereiro. Ela mostrou que a empresa estava ignorando as configurações de segurança do navegador Safari, da Apple, em iPhones e iPads, para rastrear a atividade on-line dos internautas.

O Google chamou a intromissão de um desdobramento involuntário do esforço para permitir que usuários do Safari pudessem usar a versão "curtir" de sua rede social, o botão "+1". Mas desativou o rastreamento após ele ser revelado.

A empresa também ajustou seus resultados de busca em janeiro para dar aos usuários a opção de destacar os resultados do Google+. Entre outras coisas, o mecanismo de busca começou a incluir sugestões de pessoas para seguir no Google+ enquanto excluía as recomendações para o Facebook e o Twitter, sendo que ambos são amplamente mais usados que o Google+.

O Google diz que seu mecanismo de busca não pode puxar informações suficientes do Facebook e do Twitter para dar as mesmas recomendações que faz para o Google+.

AÇÃO E REAÇÃO

Os críticos, porém, zombam da explicação e apontam essa distinção como outro exemplo de como o Google está abusando de sua posição dominante como mecanismo de pesquisa na internet para direcionar mais tráfego para seus próprios serviços.

Essas reclamações são uma parte central das investigações regulatórias em curso nos EUA e na Europa.

Auletta e Levy veem o que está acontecendo com o Google como parte do inevitável amadurecimento da empresa e de Page, que completou 39 anos na semana passada.

"Aquela chama idealista ainda arde no Google", diz Auletta. "Mas o que acontece, com o passar do tempo - e você não sendo mais uma empresa jovem -, é que você tem de assumir os compromissos de um adulto. O Facebook eventualmente terá de enfrentar as mesmas questões no futuro".

ASSOCIATED PRESS/FOLHA