Pelos saguões do hotel da praia do Rio Vermelho, em Salvador, onde acontece o V Congresso Nacional do PT, legenda de Luiz Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff,
há militantes que passeiam com uma mensagem explícita na camiseta:
"Fora o plano de Levy".
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, é um
liberal alheio ao partido, mas escolhido por Dilma, em janeiro, para conduzir o ajuste fiscal e a política econômica
de corte de gastos que, na opinião dos dois, são necessários para que o
país volte a crescer no próximo ano (no momento flerta com a recessão).
As camisetas antiministro são um sintoma da peculiar esquizofrenia
vivida pelo maior partido do Brasil, no poder há mais de 12 anos (oito
com Lula e quatro com o primeiro mandato de Dilma).
Outro
sintoma dessa contradição é a turbulenta redação do principal documento
do congresso, a chamada Carta de Salvador, da qual foram retiradas, ao
longo da semana, folha por folha, as críticas escritas em um primeiro
momento contra a política econômica do Governo.
A própria presidenta, há
poucos dias, mandou um aviso de que não se pode criticar o ministro da
Fazenda por tudo ("não se pode fazer isso, criar um Judas”) em um
pronunciamento que, para especialistas, foi dirigido especialmente aos
que estavam preparando o congresso.
O terceiro sinal de esquizofrenia de que padece o partido apareceu quando o presidente Rui Falcão aludiu ao tesoureiro João Vaccari, acusado de pertencer à trama corrupta da Petrobras
e ter angariado dinheiro para o partido proveniente dos subornos das
empresas que alardeavam contratos.
Ao ouvir o nome de Vaccari, os
participantes do Congresso aplaudiram.
Entusiasticamente.
Essa
aclamação, que durou três minutos e serviu para redimir o tesoureiro,
pelo menos aos olhos do partido, pode se compatibilizar mal com a
promessa da presidenta Dilma Rousseff de perseguir a corrupção seja lá
onde ela estiver.
Poderíamos falar de outra contradição: o PT, formação esquerdista de
inspiração popular, perdeu o controle das ruas.
As últimas manifestações
de massa pertenceram aos adversários de Lula e Dilma Rousseff, que lotaram a Avenida Paulista.
As centenas de militantes e os quadros dirigentes buscam nesse
Congresso recuperar a pulsação vital das pessoas comuns.
Mas isso às
vezes é difícil quando se detém o poder por tanto tempo e a questão é
discutida no salão de um hotel.
EL PAÍS Brasil